Setembro Verde é uma iniciativa que objetiva reforçar a importância da acessibilidade e da inclusão da pessoa com deficiência. O mês foi escolhido por ser comemorado, em 21 de setembro, o Dia Nacional da Luta das Pessoas com Deficiência, e ouso dizer que a verdadeira busca das pessoas com deficiência continua sendo a acessibilidade em todas as suas esferas. Sem acessibilidade não há inclusão, o que vai muito além de uma rampa ou um banheiro acessível. Segundo Romeu Sassaki, especialista em inclusão, a acessibilidade ocorre em sete dimensões: atitudinal, arquitetônica, programática, metodológica, instrumental, comunicacional e natural.
É por meio da promoção da acessibilidade que a gente mede a real intenção da inclusão. Ela é um direito e não privilégio. É fundamental para nos ajudar a ultrapassarmos as barreiras que nos excluem do mercado de trabalho, das escolas, dos espaços para entretenimento, cultura, lazer etc.
A falta de acessibilidade nos oprime e nos impede de estarmos mais presentes na sociedade, nos priva de tantos direitos inclusivos e direitos de consumir. E, se não somos percebidos, não somos considerados. Nós queremos e precisamos dessa visibilidade para aumentarmos nossa representatividade, não só em setembro. O ano todo.
A própria medição do tamanho da população com deficiência aqui no país é um desafio. Os números são incongruentes. O último censo, realizado em 2010, apontou que o Brasil contabilizava 45 milhões de brasileiros com deficiência, cerca de um quarto da população do país. Porém, a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), feita pelo próprio IBGE em 2019, apontou que cerca de 17,3 milhões, ou seja, 8,4% da população brasileira com idades acima dos dois anos têm algum tipo de deficiência.
Mesmo assim, o censo 2022 vai questionar se há ou não pessoas com deficiência nos domicílios apenas a cada 10 casas entrevistadas. O que mais uma vez pode distorcer a realidade sobre essa contagem. A falta de dados precisos atrapalha a inclusão produtiva. Em tempos de eleições, é preciso lembrar que essa parcela importante da população também tem demandas urgentes com a saúde, a educação, a economia, a mobilidade urbana e o mercado de trabalho.
Outros desafios estão no desbloqueio de vieses que as pessoas que não convivem com outras com alguma deficiência criam por falta de entendimento sobre nossas capacidades. A Lei de Cotas é uma das ações mais afirmativas que este país criou para estimular a inclusão. Ela tem aberto vagas nas empresas e, a partir delas, reforça também o entendimento sobre equidade e sobre como a diversidade pode ser benéfica para inovações e reputação mais cidadã das empresas.
Mais que contratar, a inclusão de pessoas com deficiência tem apontado um caminho importante para a inclusão produtiva. Desde o processo seletivo inclusivo até o acompanhamento regular do desenvolvimento de carreira de cada profissional. Somos profissionais e a deficiência é uma das nossas características. Não tem nada a ver com a eficiência ou a falta dela.
Mesmo com a lei, 46,98% das empresas no Brasil ainda resistem em aumentar a inclusão das pessoas com deficiência e não cumprem a Lei de Cotas. Segundo os últimos dados da Rais (Relação Anual de Informações Sociais solicitada pelo Ministério do Trabalho e Emprego) de 2019, dos 9 milhões de pessoas com deficiência aptas para o trabalho, apenas 530 mil estão empregadas no país. A qualidade dessas vagas também é outro desafio. Não podemos apenas servir aos cargos iniciais. Podemos e devemos ter acesso aos cargos de liderança.
Precisamos estar nos debates políticos, nos cinemas, nos teatros, nas academias, nas escolas, nas ruas, nas campanhas publicitárias, nas novelas. Estamos vivenciando diariamente situações que excluem as pessoas com deficiência de trabalhos artísticos. É o que ficou conhecido como cripface, uma prática capacitista em que os personagens com deficiência são interpretados por atores sem deficiência em peças, novelas, propagandas, modelos fotográficos. Essa atividade, além de não representar a realidade, exclui ainda mais os atores com deficiência dessa atividade e impede o desenvolvimento de novos talentos.
O cripface é expressão que surgiu nos Estados Unidos, derivada da junção de duas palavras em inglês: crippled (sinônimo de disable, que significa deficiência) e face (rosto). É inspirada em outra expressão que também é de origem norte-americana, o blackface, quando artistas brancos pintam o corpo e o rosto de preto para representar pessoas negras.
Há mais de duas décadas, a Oficina dos Menestréis, grupo de teatro dirigido bravamente por Deto Montenegro, oferece cursos e oficinas para pessoas com diversas deficiências atuarem e se apresentarem em espetáculos de arte, e a deficiência faz parte dos artistas. É assim que se promove a inclusão. Mudando de atitude e acreditando que uma pessoa tem seus talentos, além das suas características.
Para entender sobre nossos desafios, é preciso que cada um meça seu nível de inclusividade e se construa novamente, reagindo contra os preconceitos e se convertendo de fato para a inclusão, agora na posição de aliado que, além de aplausos, abre caminhos para a acessibilidade de todos, independentemente de religião, gênero, raça, cor e deficiência. Assim, o mundo inclusivo será o melhor mundo para qualquer pessoa, não apenas em setembro.
DIREITOS GARANTIDOS POR LEI PARA AS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA
O Estatuto da Pessoa com Deficiência, sancionado em 2015, garantiu uma série de direitos a aproximadamente 45,6 milhões de brasileiros com algum tipo de deficiência. De acordo com pesquisa realizada pelo IBGE em 2010, esse número representa 23,8% da população do país.
Deficiência, segundo o Estatuto, é “uma restrição física, mental ou sensorial, de natureza permanente ou transitória, que limita a capacidade de exercer uma ou mais atividades essenciais da vida diária, causada ou agravada pelo ambiente econômico e social”.
Esse importante documento prevê a inclusão da pessoa com deficiência e sua participação mais ativa na economia. Também determina o papel do Ministério Público e de Estados e Municípios na fiscalização e no cumprimento do Estatuto no âmbito do trabalho, da educação, da saúde e das políticas públicas em geral.
Continue lendo este post e fique por dentro do nosso apanhado geral sobre quais os direitos garantidos pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência!
Educação
Pode parecer absurdo, mas há pouco tempo, universidades e instituições de ensino podiam cobrar uma taxa extra em matrículas e mensalidades pagas por alunos com deficiência.
Além do fim da taxa, o Estatuto estabeleceu pena de dois a cinco anos de prisão e multa para quem impedir ou dificultar o ingresso de uma pessoa com deficiência em qualquer escola regular.
Para o ingresso em cursos de ensino superior, técnico ou tecnológico, ficou determinada uma cota de 10% de vagas para pessoas com deficiência.
Já o poder público, segundo o Estatuto, tem que garantir o pleno acesso ao currículo escolar em condições de igualdade, em um sistema educacional realmente inclusivo e com total acessibilidade, oferecendo apoio especializado sempre que necessário.
Trabalho
O Estatuto prevê a reserva de vagas para pessoas com deficiência no mercado de trabalho, obedecendo a seguinte regra:
- até 200 empregados: 2%;
- de 201 a 500 empregados: 3%;
- de 501 a 1000 empregados: 4%;
- mais de 1000 empregados: 5%.
A Superintendência Regional do Ministério do Trabalho e Emprego fiscaliza as empresas e, quando há um descumprimento da lei, elas são autuadas. Isso porque a pessoa com deficiência precisa ter seus meios de subsistência garantidos para que possa ter uma participação realmente ativa na sociedade.
Em algumas categorias, o Estatuto da Pessoa com Deficiência estabeleceu uma cota. No caso dos taxistas, por exemplo, as empresas de exploração desse serviço devem reservar 10% de vagas para condutores com deficiência.
Nos concursos públicos também há uma reserva de vagas. A cota varia de Estado para Estado, podendo chegar a 20%, segundo a Constituição Federal. No entanto, a média é de 10% de vagas destinadas a pessoas com deficiência em concursos públicos.
Saúde
O poder público tem o dever de oferecer à pessoa com deficiência uma rede de serviços especializados em habilitação e reabilitação, além de garantir o acesso a hospitais e outros estabelecimentos, sejam eles públicos ou privados.
A lei ainda garante o tratamento domiciliar na impossibilidade de locomoção a um hospital ou clínica, com medicamentos gratuitos, assim como órteses e próteses, quando necessárias.
Além disso, não pode haver nenhum tipo de impedimento de participação de pessoas com deficiência nos seguros ou planos privados de saúde. Quem impedir ou dificultar o ingresso está sujeito a detenção de 2 a 5 anos e multa.
Esporte, lazer e cultura
O Estatuto da Pessoa com Deficiência garante o acesso às atividades esportivas, culturais e de lazer. Nesse sentido, a acessibilidade em espaços públicos é fundamental.
Você sabia que é dever da companhia aérea prestar assistência a uma pessoa com deficiência que esteja no voo? Para isso, basta comunicar sobre a condição do passageiro no momento do check-in. Além disso, acompanhante tem direito a desconto na passagem caso fique comprovada a necessidade de sua presença durante o voo.
E, por falar em acompanhantes, eles também têm direito a um desconto de 50% — assim como as pessoas com deficiência — em entradas para shows, espetáculos e jogos mediante comprovação da necessidade de sua presença.
Isenção de impostos e taxas
Na compra de carros novos, a pessoa com deficiência é isenta de alguns impostos:
- Imposto Sobre Produtos Industrializados (IPI) e Imposto Sobre Operações Financeiras (IOF), para isso, a pessoa deve procurar uma delegacia da Receita Federal;
- Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS), em alguns estados a pessoa deve procurar a Secretaria da Fazenda do estado onde mora.
Em alguns estados também pode ser obtida na Secretaria da Fazenda estadual a isenção de Imposto Sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA).
Algumas cidades possuem isenção de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), neste caso o cidadão deve se dirigir à Prefeitura de sua cidade.
Além disso, pessoas com deficiência têm prioridade na restituição do Imposto de Renda. No caso de algumas doenças, como paralisia irreversível e incapacitante, cegueira ou alienação mental, há a isenção de imposto em rendimentos relativos a aposentadoria, pensão ou reforma.
Também há dedução no Imposto de Renda para alguns gastos, como a compra de cadeira de rodas, por exemplo.
Auxílios
O Estatuto da Pessoa com Deficiência garante o recebimento de alguns auxílios, tais como:
- um salário-mínimo à pessoa com deficiência com renda familiar per capita inferior a 1/4 do salário-mínimo;
- auxílio-reabilitação psicossocial de um salário-mínimo para quem tenha recebido alta de hospitais psiquiátricos. Esse auxílio faz parte do Programa de Volta para Casa e tem como objetivo reintegrar a convivência em família;
- aposentadoria com redução de período de contribuição conforme o grau de deficiência, sempre comprovado por perícia médica;
- auxílio-inclusão para pessoas com deficiência moderada ou grave que entrarem no mercado de trabalho;
- benefício no saque do FGTS para comprar órteses e próteses.
Para obter esses auxílios, a pessoa com deficiência deve procurar o Centro de Referência de Assistência Social do município onde mora. Lá, será informada sobre a documentação necessária para cada benefício.
Crimes contra a pessoa com deficiência
Quando qualquer um desses direitos é negado a uma pessoa com deficiência, configura-se um crime. Caso isso aconteça, é importante que se apresente uma queixa formal na delegacia ou uma representação no Ministério Público ou na Comissão de Direitos Humanos da OAB, para que esse tipo de atitude seja acabada. Quando o crime acontecer contra uma criança, o Conselho Tutelar deverá ser acionado.
Sabemos que ainda é comum, por exemplo, escolas não aceitarem crianças com deficiência ou planos de saúde se recusarem a atender determinados casos. Em muitas empresas, a política de cotas é apenas fachada. Denuncie sempre que um de seus direitos, que são garantidos por lei, for violado.